sábado, 31 de outubro de 2009


Arnaldo Antunes disse, recentimente, que "a coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer" pois "ser eternamente adolescente nada é mais demodé"! Acho envelhecer algo fantastico; aprendemos a ser mais ponderados, a escutar mais, a ver o valor das pessoas mais velhas, não necessariamente, mas quase sempre, mais sábias! Mas envelhecer tem um preço... começo a ter um mapa geografico nas pernas... as tão temidas varizes aparecem mesmo e nem todas as roupas te cabem mais, apesar de todo esforço de não se desfazer daqueles vestidos que há 5 anos você guarda como meta para chegar naquele peso novamente! Ele vira a meta do cabide do guarda-roupa, menos do seu corpo! Como podemos guardar roupas que não nos cabem pelo simples grande fato delas, um dia quem sabe, ainda entrarem naquele corpo que envelheceu... e não só isso, engordou! O corpo veste a roupa, estampa tempos e momentos que não voltam mais, não apenas por um decote ou uma fenda que não está mais na moda, mas os lugares que aquelas roupas percorreram junto ao corpo. Faxinando meu guarda-roupa há pouco tempo pude reencontrar alguns vestidos que lá estão há algum tempo esperando que meu corpo os vista... ao olhar pra eles lembrei dos lugares, festas encontros nos quais ainda os vestia! Roupa da memória! Marcada e ainda tentada a vesti-los um dia, pendurei-os novamente para contemplar um corpo de um tempo que não condiz mais com minha rotina do hoje mesmo desejando ansiosamente que eles me vistam e que balacem fortuitamente; no girar da dança do samba de roda! O balançar das saias e vestidos tem melodia... apesar de, na maioria do tempo do dia a dia eu não vestir vestidos sou intermitentemente chamada para o canto do guarda-roupas especialmente reservados à eles. Vestido é a entidade do guarda-roupa feminino... sem falar de um discurso de mulherzinha, o vestido consegue vestir libertando, deixa as pernas livres, tem balanço e caimento (claro que historicamente ele teve siginficados muito diferentes dessa tal liberdade usufruída hoje, se é que realmente ela existe!). Vestido também me lembra as princesas; A Bela Adormecida, a Cinderela, a Branca de Neve... são todas demodés, não envelhecem. Mas não é desse vestido e nem das princesas de quem falo aqui... nem da vida e nem do desejo de ser princesa apesar dos mais belos balançares daqueles vestidos. Nem na ficção, nem na realidade esse vestido não combina com o meu ser estrambelhado! Não paira nem sobre meus sonhos mais longínquos! Talvez por isso eu ache as noivas tão lindas, mas nunca quis ser uma delas! Talvez esteja mais pra gata borralheira, gente que faz, gente que com pé no chão que trabalha de sol a sol e que quase sempre não pode vestir vestido no seu cotidiano! Para vestir um vestido também é necessário outro requisito básico: os modos femininos como diria minha mãe. Pernas fechadas e cruzadas, cuidado ao levantar e abaixar, cuidado ao assentar-se! Pensando melhor, talvez ele não inspire tanta liberdade como a minha visão romântica desse pedaço de pano é nutrida, mas confesso que meu desejo era usar só vestido; de cores, modelos e formas diferentes; se pudesse, um para cada dia do mês. Mas o meu fazer diário não me permite isso, tampouco minha conta bancária! Enquanto eu os tiver no guarda-roupas e puder vesti-los da festa à praia já é o suficiente, mesmo os que ainda estão lá, esperando para serem vestidos, nutrem meu desejo por esse pedaço de pano tão libertador e feminino; moderno como o envelhecimento!

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O Ney... e as nossas idades!


Ontem fui ao show do Ney... sim, o Ney Matogrosso! Lindo, inclassificável como o proprio nome da turnê convida! Ele continua com o mesmo vigor dos tempos de Secos e Molhados, e o figurino é de deixar qualquer ser humano que se vista de camiseta e jeans de queixo caído! Ele posa, escracha os sentidos de quem o vê, debocha e emana sensualidade... Mas o que mais me impressiona é ele ser um Senhor de idade, mas o corpo, o molejo, o ritmo transparecido no palco não diz da idade que ele tem. Se a idade não é representativa do corpo que se tem, ela representa o quão ele foi/é importante para toda uma geração de pessoas bem mais velhas que estavam ao meu redor. Não vivi no tempo dos Secos e Molhados mas sei que muita gente que estava lá viveu!

Eu e dois amigos, nos altos dos nossos quase 30 anos, cantamos, dançamos e nos sentimos infantes perto de todo aquele público. Mas aonde está o publico da minha idade...? Por que não conhecem Ney, Cartola, Chico... classicos da música brasileira. Conhecer não significa gostar, conhecer não significa ouvir. Muita gente da minha geração sabe quem é o Ney, apenas sabe! Só se sabe quem é um cantor ouvindo seu som, só se sabe sobre um autor lendo seus livros... mas na minha geração sabe-se sobre outrem nas revistas de fofoca, nas entrevistas na Tv e na net. Sabe-se sempre antes da individualidade, da intimidade pública. Sabe-se, pois a descartabilidade disso supera o som e maneira desconcertante daquele sujeito cantar. Assim a experiencia de vê-lo e sentir de perto o que é ser vivo em cima de um palco supera qualquer experiencia do descartável.

domingo, 23 de agosto de 2009

Le français, the english, el español

Aracaju

Há pouco voltei a estudar línguas. Na verdade acho que nunca cessamos de fazer isso, a própria fala e a leitura de um texto ou do mundo são pra mim um estudo das línguas; do corpo, das sensações, dos gostos... Mas voltei a estudar francês com frequência, inglês (depois de uma vida toda) por minha conta quando posso e quando dá, o espanhol só pra leitura e acho que o português na constância da vida, isso se mais uma reforma ortográfica não vier... todas com dicionário bem ao meu lado. Tenho assim tentado não confundir todas elas na minha cabeça por mais impossível que seja não usar o português no espanhol, o inglês naquela expressão que queria muito dizer em francês mas no momento da fala me perco. Essa sensação de confusão se dá na mesma proporção da verbalização da língua portuguesa pelos nordestinos. Sou uma mineira em pleno nordeste e que ainda tenta entender que língua é essa que fala-se por aqui. Ainda estranho o sotaque, os sons, as interjeições que só o nordestino é capaz de criar. Há momentos que ainda me sinto "um peixe fora d´agua"..., já me peguei fazendo leitura labial pra entender o que se fala, da rapidez com que se fala, com a tonalidade, intensidade do que se fala. Aprendi a falar "rapaz" antes de começar qualquer frase, "pronto" para começar ou terminar um diálogo de coisas que aparentemente vão dar certas, ou não! "Cabrunco da peste" pra dizer que do que se diz é um embrólio danado... e tantas outras que em dois meses de estada ainda não foi possível me apropriar delas. Aí me pego estudando um monte de línguas estrangeiras... por mais que as expressões saltem dos livros e que eu tente agarra-las e separa-las na minha cabeça, elas só podem ser aprendidas no corpo, no gosto, os cheiros do cotidiano de quem as vive, no país de quem as vive. Nesse momento tenho estudado todas elas, mas as que tenho aprendido realmente são a nordestinidade e a sergipanidade. Essas tenho vivido na pele, nos ouvidos e diariamente no coração!

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

das mudanças...


De mudança acho que sei um pouco nos altos dos meus 20 e tantos anos. Pra começar, mudança, no literal sentido da palavra não se dá só na materialidade das coisas, ela precisa arder na alma pra ser concreta! Outra coisa já aprendi; não há mudança sem dor. Mudar, de casa, de cidade, de emprego, não é algo tão tranquilo como ir ao shopping em dia de domingo. Mesmo sabendo de tudo isso, escolhi mudar de novo....


Estou numa cidade nova, com amigos novos, com emprego novo...mas a sensação é que sou a mesma velha de sempre! Na mudança passamos a observar determinados hábitos e viver sensações que já passamos, mas que se repetem sem que possamos conter o coração, as saudades, a distância! Ainda tenho saudade da minha rotina anterior, da vida mais ou menos organizada que levava e mais tantas outras coisas! Mas a sensação de desorganizar a rotina e consequentemente a vida é também a possibilidade "do novo"... e como isso é bom depois de um tempo!


Ainda sou a mesma velha que começa a ler todas as revistas de trás pra frente, que dança na frente da TV com os jingles de propaganda, que desorganiza todos a volta pra poder se organizar, que trabalha e fala loucamente, que faz escolhas por paixão...


Mas ontem ao ver "À Deriva" de Heitor Dhalia fiquei pensando nas escolhas ... como escolhemos e também como somos escolhidos! Quando fazemos escolhas, sejam elas as mais simples, também somos escolhidos; pela roupa da vitrine, pelo objeto de pesquisa, pelas pessoas a nossa volta. Escolher, usar o livre arbítrio é algo que fazemos todos os dias, mas ser escolhido é algo tão especial que é preciso um pouco mais de sensibilidade para enxergar o outro ou a materialidade que nos escolhe ao redor! Escolher é mais fácil do que ser escolhido!


Continuo assim escolhendo e sendo escolhida nessas mudanças e andanças! São elas que dão o tom da vida que segue...

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

das panelas e da cozinha!





Sempre achei que as panelas na minha casa eram uma entidade a parte, não porque gostasse delas, muito pelo contrário. As panelas significavam que estar na cozinha exigia trabalho, cançaso, correria; de fritar o bife, refogar o arroz, fazer a salada e ainda ter que almoçar correndo pra dar conta do resto da rotina diária. Essa, na verdade, é a minha memória da infância e da adolescência daquele universo que rondava a cozinha lá de casa. Talvez por isso fiquei longos anos cozinhando arroz de saquinho, comendo em restaurantes incessantemente e também por necessidade, comendo em RU na época da faculdade (deste em especial não sinto nenhuma falta, a não ser dos amigos, do barulho e da bagunça), mas sempre sonhava com a quele arroz cozido e grudendo e super bem temperado que só minha mãe naquela correria do dia a dia sabia fazer! Ainda sonho com esse arroz diariamente pois o meu nunca vai ser igual ao dela, pois ele não tem correria, filhos querendo ir pra escola, trabalho, dever de casa! A cozinha pra mim, vinha acompanhada de tudo isso, talvez por isso ela fosse pesada demais! Alguns anos depois tive assim minha própria cozinha e mesmo assim ainda relutava em olhar para aqueles jogos de panelas, para o arroz de todo dia. Ano passado ao adentrar numa loja de departamenos cheias de promoções de jogos de panelas e faqueiros não resisti! Mas não resisti pois já tinha há algum tempo sido enfeitiçada pelo cheiro da cozinha e das cebolas e dos aromas...lembram de "Como água para chocolate?" A cozinha há alguns anos tem sido lugar do refúgio, do encontro, das risadas, do tempo da vida, dos sabores e dos aromas! Fui enfeitiçada! O grande penar é que ainda não consigo pensar naquela cozinha do dia a dia, aquela da minha mãe...ela pra mim ainda é isenta de todos os prazeres acima talvez por conta das escolhas do trabalho e de tantas outras ao longo do dia... de pesquisar, de estudar, de dar aulas, de fazer aulas! Bem que tenho tentado ser feliz com uma panela no fogão todo dia, mas acho que não tenho tanta vocação para trabalhar e ser dona de casa como a geração da minha mãe! Mas já aprendi que a boa mesa reúne tantas maravilhas que é impossível não olhar para aquele jogo de panelas e para o faqueiro sem querer usá-lo tanto quanto eles merecem ser manuseados na minha mesa diária...ou, só nos fins de semana!

domingo, 9 de agosto de 2009

dos gostos...


de colo de mãe
de beijo de cinema
de abraço apertado
de inverno e de verão
de água do mar e da piscna
de falar mais do que de ouvir
de pensar, e pensar, e pensar...
de ver e emocionar
de beber e conversar
do bar, do bistrô, da música
da boa música
do ritmo que toca o corpo
do balançar das saias e vestidos
do som do canudo no fim do suco
da janela do carro que enquadra
de cantar dirigindo
de cinema gelado
dos livros da estante
do cheiro de lençol limpo
de almofadas na cama
da carteira das salas de aula
do silêncio de estar só
da agitação de estar acompanhada
da foto no quadro
dos amigos de perto e de longe
dos instrumentos que não sei tocar
da agenda cheia
da comida que cheira
de cebola dourada na panela
de vinho na taça
de gente que passa
das histórias do passado
da organização do futuro
da vida intensa do presente
de telefone que toca
da foto que conta
de sorriso no rosto
do desgosto só um pouco
de vento que balança o cabelo
do suspirar alheio...

gosto aguçado por "Elsa e Fred" o filme...